Durante a Antiguidade Clássica, o homem para registrar suas ações de contar, medir, se deslocar e fazer a leitura do seu universo físico, usando a sua intuição, criou a Matemática. A partir do século IV a.C, com “Os Elementos” de Euclides, tornou-se uma ciência dedutiva. Na Era Medieval, esses conhecimentos foram esquecidos: todo o saber estava contido nas Sagradas Escrituras.
Com a invenção da imprensa de Gutenberg, a Reforma Protestante e o florescimento das artes e da ciência no século XV, deu-se a primeira grande ruptura histórica: o RENASCIMENTO, marcando o começo da Era Moderna. As grandes navegações, com a descoberta do Novo Mundo e a introdução da ciência experimental por Galileu e Bacon, determinaram avanços técnico-científicos e, também, uma transformação geopolítica do mundo ocidental. O século XVIII foi cenário da segunda ruptura histórica que deu origem ao movimento conhecido como Iluminismo. A independência dos Estados Unidos da América e a Revolução Francesa marcaram essa ruptura. Na Era Moderna, com o fim do feudalismo e ascensão da burguesia foi levantada a bandeira: EDUCAÇÃO PARA TODOS. O ensino da Matemática passou a ter status de disciplina obrigatória, desde o fim do século XVIII até o fim do século XIX e começo do XX, sem haver mudança curricular. A Sociedade burguesa entrava na ERA INDUSTRIAL. Com problemas tecnológicos, engajando um número cada vez maior de pessoas surgia a classe operária. Uma mudança curricular da Matemática era necessária, levando Felix Klein e Howard Fehr a propor no Congresso de Matemáticos (Roma, 1908) a Primeira Reforma Internacional do Ensino da Matemática. A ação de Euclides Roxo e outros professores do Colégio Pedro II repercutiu no Brasil.
Os avanços científicos e tecnológicos, antes e durante a segunda grande guerra, motivaram profundas mudanças na sociedade de após-guerra que determinaram, sob a liderança do matemático e educador Caleb Gattegno, a criação, em 1953, do CIEAME (Comissão Internacional de Estudos e Aperfeiçoamento de Educação Matemática), presidida por Choquet, matemático francês.
Nos anos anteriores, haviam sido organizados quatro seminários, onde foram discutidos por matemáticos educadores, filósofos e psicólogos, em trabalhos em grupo, experiências e pesquisas por renomados pesquisadores e simples professores de sala de aula. Nesses seminários, foi discutido o isomorfismo entre Estruturalismo Matemático do grupo Bourbaki e o da Psicologia Genética, liderados por Dieudonné e Piaget, respectivamente.
Em 1959, a OECE precursora da ODCE (Organização de Cooperação para Desenvolvimento Econômico) reuniu 600 professores de 20 países em Royamont, França para discutir esse isomorfismo, sendo lançada a Reforma do Ensino da Matemática, conhecida como da Matemática Moderna. Por outro lado, a partir de 1960, o ICMI se desvinculou do ICM e passou a realizar, de quatro em quatro anos, o ICME (Congresso Internacional de Educação Matemática), consagrando um novo campo de estudo e pesquisa a EDUCAÇÃO MATEMÁTICA.
A UNESCO, preocupado com a reforma da Matemática Moderna, organizou um Seminário Internacional de Educadores Matemáticos, em Lyon (França, 1974). Os encontros deveriam ser feitos por regiões; foi realizado em Montevideo (1974) o seminário: “As aplicações do Ensino e Aprendizagem da Matemática na Escola Secundária”, sendo criado o CIAEM (Comitê Inter Americano de Educação Matemática) filiado ao ICMI e presidido por M. Stone.
O movimento da Matemática Moderna foi um campo fértil para inovadores. Zoltán Dienes e Georges Papy foram e tiveram grande influência entre nós. Dienes no grupo GEMPA do Rio Grande do Sul sob liderança de Esther Grossi e GEEM em São Paulo com Oswaldo Sangiorgi. No Rio de Janeiro, Arago Bachx, ex-bolsista de Papy, fundou o GEMEG (Grupo de Educação Matemática do Estado da Guanabara) de curta vida pela falta de apoio e a oposição dos matemáticos e professores conservadores. A ideia, no entanto, persistiu. Alguns professores, entre eles, Anna Averbuch, com a minha volta depois do estágio no IREM (Instituto de Pesquisa em Ensino da Matemática) de Estrasburgo, França, em 1975, resolveram agrupar colegas da Matemática, Psicologia e Pedagogia. Devido à minha experiência no IREM e disponibilidade como aposentada, resolvemos dar prosseguimento ao GEMEG e fundar o GEPEM (Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática).
Em assembleia geral, 24 de fevereiro de 1976, com a presença de 39 professores, foram aprovados os estatutos e eleita a diretoria do GEPEM, como consta do número 1 do Boletim, que continua sendo publicado por esses 37 anos e referência da CAPES em pesquisa em Educação Matemática.
A década de 1970 foi de grande efervescência nacional e internacional em Educação Matemática. Além do GEPEM, outros grupos e programas foram criados, merecendo destaque o da UNESP/Rio Claro. Internacionalmente, passaram a ser questionados os exageros da reforma da Matemática Moderna, culminando no ICME de Karlsbruch, 1976, onde surgiu o movimento “back to basic” e criado o PME (Psicologia da Educação Matemática), grupo cada vez mais ativo com reuniões anuais.
Em 1980, fui reintegrada ao Instituto de Matemática da UFRJ, onde os professores Lucia Tinoco e Radiwal Alves Pereira já desenvolviam trabalho de formação de alunos da licenciatura, possibilitando a formação de um grupo maior de professores para, em 1982, apresentar o Projeto de Formação de Professores de 1º, 2º e 3º grau para atender o edital do MEC/SESU “Integração da Universidade com o ensino do 1º grau” e, posteriormente, ao Programa da CAPES “Melhoria do Ensino de Ciências e Matemática”, origem do SPEC (Subprograma Educação para a Ciência) do PADCT (Programa de Apoio ao Desenvolvimento científico e tecnológico) o bem sucedido “Projeto Fundão – Desafio para a Universidade” que completa 30 anos.
Com o desenvolvimento dos programas e grupos existentes, e a criação de muitos outros, era imprescindível a existência de uma associação de âmbito nacional. Havia unanimidade dos componentes dos principais grupos existentes sobre a criação da Sociedade Brasileira de Educação Matemática. A professora Tânia Campos, chefe do Departamento de Matemática da PUC/SP, conseguiu que aquela Universidade sediasse um Congresso Nacional de Educação Matemática para discutir e aceitar os princípios desta Sociedade. Procurou os grupos do Rio que não somente concordaram com a ideia, como também, aceitaram o desafio de redigir a proposta. Assim, foi na minha casa que, juntamente com João Bosco Pitombeira e Roberto Baldino redigimos a proposta que, aceita pelos órgãos financiadores, permitiu o Primeiro Encontro de Educação Matemática, em 1987, na PUC/SP.
O primeiro ENEM (Encontro Nacional de Educação Matemática) teve o êxito esperado. A proposta do professor da Universidade de Maringá, PR, para sediar o segundo ENEM foi aceita. Durante o segundo ENEM, a preparação da Assembleia Geral para a criação da SBEM e eleição por aclamação da primeira diretoria foi bastante tumultuada; havia muita divergência entre os componentes dos vários grupos de Educação Matemática existente. Teve, entretanto, um final feliz. A SBEM foi criada no dia 27 de janeiro de 1988 e eleita a diretoria, encabeçada pelos professores Nilza Bertoni e Cristiano Muniz, aos quais os educadores matemáticos são devedores de agradecimento por terem conseguido estruturar a SBEM, com os membros da diretoria dispersos por esse Brasil.
Para terminar estas notas sobre “Fatos históricos determinantes da evolução da Educação Matemática”, deixo para meditar esta frase de Octavio Ianni:
“...nos fins do século XX e começo do século XXI nós estamos metidos numa grande ruptura histórica.”
Na passagem da Era Medieval para a Era Moderna deu-se a primeira grande ruptura histórica: O RENASCIMENTO.
Estamos vivendo outra grande ruptura da passagem da Era Industrial para a Era Digital que denomino Outro RENASCIMENTO pelas semelhanças entre as determinantes de ambos.
A atuação da SBEM, nessa fase da evolução da Educação Matemática será um fator decisivo como foram as Comissões, Comitês e Sociedades para a evolução da Educação Matemática que procurei citar.
Autora: Maria Laura
Montagem: Matheusmáthica
Referência:
Carta de Maria Laura Mouzinho a comunidade de educadores matemáticos: sua última produção em vida.
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