quarta-feira, 9 de março de 2011

UMA HISTÓRIA DE QUASE NADA

Era uma vez um um.

Ora isto não parece nada estranho, mas é.

Porque se começarmos a história assim, ficamos com a ideia de que há mais do que um um, o que não é verdade. Um há só um.

Portanto, recomecemos.

Era uma vez o um.

Pela mesma ordem de razões, já nem vou dizer que era uma vez um dois nesta história. Porque embora se trate de um dois, parecendo um número mais acompanhado do que o um, a verdade é que também só há um dois, o que faz dele um ser tão solitário como o primeiro.

O primeiro? Eu disse o primeiro? Não. Pensando positivamente, o primeiro será o zero (nada de pensamentos negativos, para evitar perder-me lá atrás no menos infinito, onde nem se sabe sequer como as histórias começam). Dizia eu, então, que o primeiro será o zero, embora pareça bizarro que coisa nenhuma possa ser o primeiro seja lá do que for e tenha tanta importância neste mundo. Mas é a verdade dos factos. 
Com isto tudo, já perceberam que o um é que é o segundo. E, claro, o dois é o terceiro.

 Apresentadas as personagens, avancemos o possível com tão pouco...

 Ora bem, os três, quero dizer (para não haver confusão), o zero, o um e o dois, encontraram-se para tomar chá e pensar nas coisas da vida.

Ai, dizia o zero, nada me corre bem! É espantoso como nenhuma coisa boa acontece, como ninguém me dá valor, como este vazio, esta (in)existência se prolongam sem qualquer solução à vista!

O um, compadecido com a posição do zero, (à esquerda, naturalmente, e sem capacidade absorvente), tentou animá-lo, mas com pouca convicção, pois também ele  estava a passar um momento único e difícil sentindo-se completamente neutro e invisível: Oh zero, um dia destes vais descobrir que isto não é nada, que tudo se irá resolver num instante. Duma coisa podes estar certo, um amigo compreensivo é a única coisa que pode ajudar numa altura destas. E, olha, mais vale um um na mão do que um dois a voar...

O dois, farto daquele diálogo sem rumo, e acossado pela insinuação do um, furtou-se ao triálogo triste que poderia ter nascido ali e recorreu ao monólogo para expressar  o seu duplicado enfado: Mas que par vocês me sairam! Que dupla inconsequente! Que tal o dobro da luta para sair do dilema? Lamúrias são só um dueto de queixumes... Eu cá vou-me embora desta história parada! Bom proveito para o  duelo de lamentações! Quem sabe encontro por aí o três para uma sequência com futuro. Não há duas (dois) sem três... e dois olhos vêem melhor que nenhum ou que um, rematou em jeito de vingança, fazendo reverter a seu favor a sabedoria popular sempre à mão de qualquer um (ou dois, ou mais).

E esta história não tem um fim, porque seria preciso saber o que aconteceu ao dois e ao três, talvez ao quatro e assim sucessivamente... até mais infinito.

O melhor é não esperar...  e ir com eles para ver! Para fazer acontecer...
 
Teresa Martinho Marques

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