Concurso inglês elege as mais belas equações da história
Thereza Venturoli
As equações matemáticas são como as mulheres. Algumas são simples, outras, complicadas. Nenhuma é fácil. As mais difíceis acirram a curiosidade e prendem a atenção dos homens por muito tempo. As mais simples revelam mistérios até então insuspeitados. A maioria não pode ser completamente decifrada. Robert Crease, historiador e filósofo da Universidade Estadual de Nova York, em Stony Brook, acredita ter encontrado outra dimensão feminina nas equações: a beleza. Crease propôs aos leitores da revista inglesa Physics World um concurso para eleger as mais belas formulações matemáticas. Computadas as sugestões, o primeiro lugar foi dividido entre criações arcanas mas de uso corriqueiro entre físicos e matemáticos. Uma das escolhidas foi uma equação elaborada pelo suíço Leonhard Euler (1707-1783), empregada em cálculos de matemática pura. Ela dividiu o primeiro posto com quatro outras formulações de autoria do físico escocês James Clerk Maxwell (1831-1879), que descrevem o comportamento de campos elétricos e magnéticos.
Mas pode existir beleza em uma fórmula cheia de números e sinais? A definição clássica diz que a beleza é a qualidade que uma pessoa ou um objeto têm de provocar prazer aos sentidos ou de elevar ou deleitar o espírito ou a mente. Quanto ao prazer dos sentidos – da visão, especificamente –, os leigos podem perceber beleza na ferramenta matemática que gera imagens chamadas de "fractais" como a que se vê no alto da página. Os fractais são produzidos a partir de equações matemáticas interpretadas com formas e cores por computadores. A técnica, desenvolvida na década de 70 pelo francês Benoit Mandelbrot, da Universidade Yale, permitiu visualizar padrões uniformes em formas da natureza – como a ramada de uma árvore ou o recorte de um continente – que não seguem a regularidade dos quadrados ou círculos. Os fractais são belos, sem dúvida. Mas as apavorantes equações, que tiram o sono dos estudantes e dificultam a leitura de qualquer texto, podem ser bonitas?
Físicos e matemáticos dizem atingir o tal "deleite da mente" ao lidar com as seqüências de algarismos e letras intercaladas por símbolos bizarros. Enxergam beleza onde as pessoas sem treino vislumbram sinais desconexos. O editor do livro Uma Breve História do Tempo, do inglês Stephen Hawking, alertou o físico sobre o uso dessas sopas de letras e algarismos: elas afastam os leitores e prejudicam as vendas. O gênio de Cambridge decidiu manter na obra apenas a equação da teoria da relatividade especial de Einstein, a famosa E = mc², que compete com o retrato de Che Guevara feito pelo fotógrafo Alberto Korda como a mais popular estampa de camiseta.
Mas pode existir beleza em uma fórmula cheia de números e sinais? A definição clássica diz que a beleza é a qualidade que uma pessoa ou um objeto têm de provocar prazer aos sentidos ou de elevar ou deleitar o espírito ou a mente. Quanto ao prazer dos sentidos – da visão, especificamente –, os leigos podem perceber beleza na ferramenta matemática que gera imagens chamadas de "fractais" como a que se vê no alto da página. Os fractais são produzidos a partir de equações matemáticas interpretadas com formas e cores por computadores. A técnica, desenvolvida na década de 70 pelo francês Benoit Mandelbrot, da Universidade Yale, permitiu visualizar padrões uniformes em formas da natureza – como a ramada de uma árvore ou o recorte de um continente – que não seguem a regularidade dos quadrados ou círculos. Os fractais são belos, sem dúvida. Mas as apavorantes equações, que tiram o sono dos estudantes e dificultam a leitura de qualquer texto, podem ser bonitas?
Físicos e matemáticos dizem atingir o tal "deleite da mente" ao lidar com as seqüências de algarismos e letras intercaladas por símbolos bizarros. Enxergam beleza onde as pessoas sem treino vislumbram sinais desconexos. O editor do livro Uma Breve História do Tempo, do inglês Stephen Hawking, alertou o físico sobre o uso dessas sopas de letras e algarismos: elas afastam os leitores e prejudicam as vendas. O gênio de Cambridge decidiu manter na obra apenas a equação da teoria da relatividade especial de Einstein, a famosa E = mc², que compete com o retrato de Che Guevara feito pelo fotógrafo Alberto Korda como a mais popular estampa de camiseta.
Para os olhos treinados, as equações são a transcrição matemática da natureza. Se a natureza é bela, sua imagem fixada em sinais também pode ser bela. Interessante que, para muitos votantes no concurso da revista Physics World, a beleza das equações transcende o mundo natural. "O que poderia ser mais místico do que um número imaginário interagindo com um número real tendo como resultado o nada?", justificou um dos leitores da publicação inglesa ao votar na equação de Euler. A mesma formulação foi considerada por outros como "misteriosa e sublime" e "cheia de beleza cósmica". Alguns encontram elegância na simplicidade da fórmula, outros nas revelações que ela embute ou nos desdobramentos teóricos que ela desencadeia. As equações – particularmente as empregadas na física – representam o resumo de uma às vezes tortuosa caminhada intelectual. Assim, de certa forma, podem ser, com grande imaginação, comparadas às palavras mágicas dos alquimistas.
O astrônomo alemão Johannes Kepler (1571-1630) dizia que estudar as relações matemáticas entre os corpos celestes nos aproximava de Deus à medida que estávamos decifrando a linguagem divina. De um ponto de vista mais terreno, as equações são como tijolos na construção do conhecimento científico – algumas se confirmam e, assim, se empilham ao longo do tempo, elevando a estrutura. Outras são refutadas, e seu vazio abre espaço para novas idéias. "A ciência não cresce de modo linear, pela acumulação do conhecimento. Muitas vezes precisamos reformar esse edifício, derrubando alguns de seus tijolos", diz Roberto Martins, físico da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e especialista em história da física.
Sendo uma forma econômica de retratar a realidade, a equação é uma mensagem cifrada, compreensível por quem domina os conceitos nela representados, não importando o idioma de quem a criou nem de quem a lê. Ser universalmente percebida é justamente uma das características da beleza. Desse ponto de vista, Leonhard Euler foi um criador de beleza tanto quanto Rubens na pintura ou Marcel Proust na literatura. O gênio suíço – que começou a perder a visão aos 28 anos – criou várias "abreviaturas" para substituir números e operações muito complexas. Euler criou a notação das equações. Foi ele, por exemplo, quem disseminou o uso da letra grega pi para representar a razão entre a circunferência de um círculo e seu diâmetro – um número composto de uma série infinita de algarismos, geralmente representada pelos oito primeiros, 3,1415926. A fórmula minimalista 1 + 1 = 2, também citada entre as mais belas equações no concurso inglês, traduz a capacidade humana de criar símbolos para representar o abstrato – a começar pelo simples mas fundamental ato de contar objetos. Em sua simplicidade, ela talvez represente melhor do que as outras o que há de humanamente belo na matemática. Os estudiosos aceitam a tese de que o cérebro dos seres humanos já nasce pronto para a linguagem – e até para a gramática. São dádivas. O cérebro não nasce aparelhado para a matemática. Tudo dessa ciência teve de ser conquistado pela engenhosidade da mente humana em suas relações com a natureza. A matemática seria assim o fogo que o Prometeu da mitologia grega roubou dos deuses e deu aos homens. Isso é belo.
Revista: Veja
Edição 1881. 24 de novembro de 2004
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